22 de janeiro de 2014

O APANHADOR DE DESPERDÍCIOS
Uso a palavra para compor meus silêncios.
Não gosto das palavras
fatigadas de informar.
Dou mais respeito
às que vivem de barriga no chão
tipo água pedra sapo.
Entendo bem o sotaque das águas.
Dou respeito às coisas desimportantes
e aos seres desimportantes.
Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas mais que as dos mísseis.
Tenho em mim esse atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância de ser feliz por isso.
Meu quintal é maior do que o mundo.
Sou um apanhador de desperdícios:
Amo os restos
como as boas moscas.
Queria que a minha voz tivesse um formato de canto.
Porque eu não sou da informática:
eu sou da invencionática.
Só uso a palavra para compor os meus silêncios.
Manoel de Barros

16 de janeiro de 2014


O querer
(Brisa Marques)

Quero, mas não tenho o que quero
Quero sempre o que não posso
Quero tanto que não quero querer tanto, me esforço
Mas te quero tanto quanto quero o canto enquanto verso
É cantando que converso, canto tanto quanto posso
Se reparo, me disperso, se preparo, me reforço
Quanto mais eu vento leve, mais o tempo pede forte
Para a planta está a terra, como a vida para a morte
Sou um tanto controverso, mas confesso tenho um mote
De não ter tudo o que quero, quero contar com a sorte