21 de março de 2019

Ele aparece como o vilão da história, ela como a chata: para todos os efeitos, quem abandona é ele e quem gruda é ela. Mas, na verdade, são os dois que precisam tanto do abandono, quanto do grude — pacto simbiótico. Ambos precisam desta intermitência: na calada da noite, silenciosamente, o tecido se desfaz, instaurando a ameaça de desmanchamento do junto — e, conseqüentemente, de cada um deles, indissociáveis nesse junto. À luz da manhã, os fios, visivelmente, se tecem. Nessa alternância, o que se busca é estar certo de que a trama desse drama perdura. É preciso ver para crer infinitas vezes. Repetir sem parar o perigo de se desfiar, para certificar-se do eterno e absoluto dessa trama. Penélope controla o tempo: tece a trama da eternidade, Ulisses controla o espaço: monta a imagem da totalidade. Dois estilos complementares da vontade de absoluto: imobilidade morna e melosa, mobilidade fria e seca. É a mesma esterilidade. Uma só neurose: equilíbrio homeostático. Medo de viver. Vontade de morrer.


trecho de:  https://territoriosdefilosofia.wordpress.com/2014/06/07/amor-o-impossivel-e-uma-nova-suavidade-suely-rolnik/

Nenhum comentário:

Postar um comentário